sexta-feira, 3 de junho de 2011

Ciclo


Eu, que já perdi a hora e o lugar, escondo na boca o doce que a hora não tem. My darling, oh, darling, darling, dear darling, estou presa longe do asfalto, longe da estrada, longe da rua pela qual não posso andar. Darling, eu nunca chego ao ponto em que se pode andar na rua sem que me brote na testa (como o nariz crescia de Pinóquio) as palavras “live and get locked, live and get locked...”
Agora que não tenho mais medo, nenhum desses medos que costumamos ter quando coisas boas aparecem, essas palavras – repreensivas, mandonas, assassinas – ficam me escondendo assim, toda para dentro das paredes e dos muros. Darling, oh, darling, darling, dear darling, amanhã eu fujo pelo mar de tecidos, lenços e lábios.
Escapo pela porta da frente, assim, de cara lavada e tênis azuis, sorriso de quem não tem paredes ou muros. Amanhã eu te prometo que quebro as paredes e não dou ouvidos ao “live and get locked”, amanhã eu vivo, yo vivo, je vis, I live, my darling. No mar de tecidos até a terra dos homens, amanhã eu escalo as montanhas de tempo perdido mesmo com palavras me brotando na testa, paredes quebradas, muros caídos, e algumas conversas ao telefone com essas vozes molengo-capengas de quem esconde tristeza.
Mas tudo isso só para que depois de amanhã, my darling, oh, darling, darling, dear darling, para que depois de amanhã eu não perca a hora e o lugar e que o doce da hora seja mais doce que o doce na boca. Para que depois de amanhã eu esteja no asfalto, na estrada, andando na rua, com a testa limpa de palavras, sem montanhas de tempo perdido, sem voz molengo-capenga, sem paredes, sem muros, com darling.

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