quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Céu de Baunilha


Meus dois C’s, queridos C’s: Caio e Clarice. Vocês me contam sobre os seus carnavais da infância em Recife, das praias repletas de gente feliz e eu, neste ano, que nem cheguei perto do cheiro do mar. Ultimamente ando sentindo apenas dois perfumes, como se só existissem estes no mundo, de duas pessoas distintas, em todo o lugar: no meu sofá, na calçada da avenida, dentro da lotação, no pátio da escola, dentro dos livros. Estes perfumes de canto de pescoço que somente senti e não provei, que me abraçaram de costas e me adoraram quando pus riso nos lábios, que sujaram meus dedos com um doce pegajoso e me iluminaram com a mistura do branco com azul.
Nenhum deles sabe como é estranho estar entre iguais, em meio a pessoas rindo na sua nuca sobre coisas que você não ouviu porque estava preocupado demais com um texto muito bonito que você acabara de descobrir colado em algum papel vermelho e que lhe aquietou o espírito.
Meus queridos, banhados em confete, purpurina e serpentina, vocês podem me escutar, por favor? Essa gente anda sorrindo demais (e eu não sei para quem), essa gente anda lendo demais (e eu não sei o quê), essa gente anda planejando demais (e eu não sei para onde). Eles não sabem que quando os meus olhos pousam, serenos, sobre os deles, estou arquitetando friamente a forma mais digna de exclamar: “EU-TE-ODEIO”. Porque as pessoas para as quais eu exclamaria “eu-te-amo” estão todas caladas há dois ou três cômodos do meu, caladas há três ou quarto bairros daqui, há duzentos ou três quilômetros, há uma ou outra vida - como vocês. Meus queridos, será que eles não poderiam simplesmente perceber quem são?
E olha só – acabo de descobrir meio bombom na mesa ao lado (as coisas comigo são mesmo muito engraçadas quando estou meio azeda). Até ele cheira a perfume de gente. Ou seria o meu próprio nariz, mergulhado em sonho e sono, afundado no tempo-espaço descontínuo, que sente em tudo o mesmo aroma com o qual se acostumara? Com as mãos trançadas sobre o ventre morno e os dedos sujos de chocolate (outra vez), observo o céu de baunilha de Monet. Meus queridos, vocês também viam o céu nesta cor rosada/amarelada feito um domingo no litoral? Está tudo tão rosado e eu só queria que tudo fosse cinza, cinza, meus queridos, cinza como as nuvens no inverno.
Por quê mesmo estou escrevendo? Ah, sim. Porque não vi o mar. Porque há pessoas me cuspindo a poeira do mundo. Porque o meu céu tem uma cor esquisita e a gente embaixo dele está se corrompendo e expondo seus vícios (e também os meus) em faixas megalomaníacas. E também porque vocês sabem – e só vocês – como é que funciona essa coisa toda de respirar, não saber como o resto da vida funciona e ainda assim ter a audácia de escrever sobre isso. Meus queridos, vocês poderiam me ensinar a engolir a porcaria dos outros e a minha própria porcaria misturada aos desejos dos outros e aos meus próprios desejos?
Um fim abrupto para não me estender aonde não devo. Era só isso mesmo que eu queria dizer e perguntar. Sem Post Scriptum nem nada.

Nenhum comentário:

Postar um comentário