sábado, 15 de janeiro de 2011

Esquina


Corro agora na mesma rua que outrora eu me encolhi. Você também consegue ouvir as pessoas sussurrando pelas nossas costas nesse caminho mal iluminado as coisas que nós não queremos ouvir? Você consegue ignorar as vozes que cochicham no nosso encalço as coisas que estamos cansados de saber? Eu tenho uma paixão tola por caminhar em lugares vazios, mas estes estão todos ocupados com gente que não sabe silenciar (e eu tenho medo).
O cheiro de vinho na taça dos outros (que bebem nos cantos da rua porque, afinal, o amanhã não importa) me faz salivar e de alguma forma me clareia os olhos para os seus rostos bonitos e para o meu próprio corpo cansado, erguido do chão, jogado no espaço, regado em suor.
Tenho aprendido a me orgulhar, a ceder espaço, a cantar baixinho no escuro do quarto com todo o resto da rua a dormir. Porém agora ela não dorme e me persegue, fria e insólita. As esquinas do meu roteiro cotidiano sussurram: “cante o que não dá pra falar, cante o que não dá pra gritar...”. Então eu corro - da ansiedade do próximo mês, dos cochichos sombrios, do medo e também do alívio, da rua, da rua.

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