domingo, 23 de janeiro de 2011

Sonetos


Esperei as palavras que não vieram sob um céu nebuloso de madrugada. Esperei escondendo-me atrás de uma xícara branca de café doce, com escuras pálpebras sonolentas embaixo dos meus olhos catalisadores. Eu tive medo da acidez da minha própria língua e da rigidez dos meus ossos. Eu temi as suas feições dramáticas extinguindo tudo o que eu era com estes olhos inquietos. Eu – o verme com funções de gueixa, o seu caso perdido – adormeci às seis da manhã para fugir do calor. Adormeci à espera de uma intervenção divina em forma de bilhete, respondendo que coisa era essa que parecia uma epifania, mas que não tinha nome, não tinha cor, não tinha cheiro, só alguns pensamentos desalinhados aqui e ali.
As coisas estavam mesmo muito doces, você não acha? O meu teto estava muito firme, não é mesmo? Eu era igual a todas as outras pessoas, sim? Eu não era? Você lembra como eu costumava abrir a boca o tempo todo e pôr as mãos com os punhos fechados sobre os meus lábios, ansiando por um santo de porcelana?
Essas coisas doces deixaram nos meus pés algumas saudades, algumas vergonhas, uma fita de vídeo de um filme em preto-branco-rosa sobre aves de pescoços longos, moças encantadoras e volúpia. Bilhete com resposta para aquela pergunta (“que sentir é esse? sem nome, sem cor, só reflexos”) não veio nenhum.
As coisas sujas e as belas são as mesmas – elas apenas se escondem - e vieram até mim, nessa hora estranha de um tempo incerto. Eu apenas não sei os seus nomes. Coisas belas e sujas tem nomes? Ou a beleza (suja) só existe porque vive uma vida secreta e anônima em que ninguém sabe a sua verdadeira face e, portanto, quando aparece, é isso: você não sabe o que é aquilo (tão lindo e incompreensível) e espera um lembrete divino com explicações?
Entretanto, o bilhete não vem. Porque a minha janela é pequena demais para o seu Deus entrar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário