terça-feira, 5 de julho de 2011

Antropofagia


Ando achando que todos os tipos de relacionamentos existentes foram feitos para ir enlouquecendo a gente devagar, assim como o cigarro vai matando aos poucos. Tenho achado que conviver é definhar em silêncio.
Todos os principais motivos da sua loucura não se importam com o que são e nem sequer sabem o que são. Nem desconfiam que andam te enlouquecendo quando discutem com você no meio de uma escada ou quando insistem (e como insistem) – é só pra te definhar, é só pra te fazer engolir em seco, é só pra te deixar no caos que você acumula todos os dias. É só pra te fazer deixar.
Uma caixa de charutos empobrecida consome tantos pulmões quanto as pessoas se consomem, em uma eterna antropofagia. Todo o ser humano é um canibal nato e não nega sua condição por puro prazer. Há um prazer na agonia alheia que não se explica, e também na própria agonia; o mesmo prazer daquele que inveja e daquele que fuma, do que ambiciona e daquele que come em excesso.
Dotados de podres poderes e “liberum arbitrium”, nós nos mutilamos em segredo. Finge que não entende quando digo que as paredes ainda molhadas de tinta têm cheiro de lágrima. Finjo que o meu silêncio não é um punhal. E continuamos nos perdendo, perdendo, perdendo, perdendo, perdendo...
em nossas próprias mentes – dois Dorothys sendo levados por um ciclone à Terra de Oz.
E o próprio amor (que nos parece sempre tão imaculado) chora, odeia, arrepende, desfaz e volta a ser carinho, afeto, açúcar. Para logo depois ensurdecer, rasgar, estraçalhar, morder e decepar tudo outra vez, no eterno ciclo dos canibais.
Como Hannibal, eu afundo na tua carne humana os meus dentes igualmente humanos, com os olhos ainda sãos. E enlouqueço.

(tão doce quanto sanguinário)

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