terça-feira, 16 de novembro de 2010

Dentes Sedentos


Bolhas flutuantes de fascínio fluindo por cada centímetro de um corpo magro. Olhos colados em um rosto próximo que suspira. De meu lugar, observo dentes quadrados e perfeitamente postos na gengiva prontos para morder, rasgar e dilacerar. Os dentes prontos para sentir novamente o sabor doce, amargo, agridoce, podre e delicioso – tudo é o mesmo! Porque os dentes é que sentem. E são as unhas que agridem de forma afetuosa. E os pés que se sujam em uma poeira desgastada.
Assisto, pois estou tomada por um cansaço-alívio de quem correu, de quem pulou e de quem soltou os ossos em um dia suave, com cabelos cheirosos e pernas rígidas. Blasfemando os erros cometidos com a voz rouca, observando curiosamente o desejo repentino aflorar nos dedos. Nem mesmo sabendo o porquê. Nem mesmo entendendo o que é que me fazia empurrar os braços naquela direção, virar a cabeça falsamente raivosa para o lado de lá e agitar as mãos de forma tola para cá. Um arrebatamento tomando conta de cada minúsculo poro e cada miúda célula, da raiz dos dentes até a borda do calcanhar. Tal sensação ignorava a cabeça e o cérebro, não havendo espaço algum para lucidez ou consciência, apenas instinto e impulso direcionados involuntariamente para uma loucura palpável ali, no alcance das mãos. O desejo incontrolável de ferir com cuidado, destroçar com meiguice, rasgar com afeto.
Quando permitir que eu me afogue em minha própria sede, não fuja, não se deixe ir. Mal aprendi a fazer conflito, machucar nem devo saber. Sossegue: talvez eu não fira, talvez não te doa, talvez nem tenha dentes e unhas - devo ter arrancado todas.

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