quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Conselho Inútil


Vamos parar com esse jogo em que você finge que é o que diz enquanto eu finjo que acredito. Vamos parar! Posso te dar um espelho caso você não tenha um. Só não quero mais ter que simular que acredito, que espero, que me nego a ver. Está tudo tão claro. Ainda devo realmente ter esse terceiro olho que fareja e pressente. Cá estou, redigindo um conselho para ambos eu e você, esperando que seja o suficiente e que se dê conta de que agir como se fosse outra pessoa não leva a lugar algum. Este jogo sim é o meu: costurando com letras e consertando com palavras.
Acorde. Não posso ser seu antídoto enquanto eu mesma só conheço os venenos doces que coçam e ardem na garganta. Não precisa tentar me decifrar, não precisa me engolir, me suportar, respirar o mesmo ar que eu, não precisa me amar, desvendar meus por quês, decorar minhas músicas, adquirir minha apatia, acreditar que tudo o que escrevo é sobre alguém, conhecer meus amigos, notar o meu silêncio, secar as minhas lágrimas, me acompanhar até a porta de casa, saber dos meus finais de semana, quantas pessoas já amei, de quem tenho ódio, se prefiro o frio ao calor, quantos anos eu tenho, se prefiro Lennon, George ou Ringo, se gosto de fotografia, quais filmes assisti semana passada. Poupe seu tempo, sua saliva, seus dedos, suas pernas, seu esforço mental. Se interesse pelo pouco que sabe, pela sombra que me persegue, pelas coisas que estão estampadas e não há como negar, pela aparência tola e nada mais. Não se infiltre aqui dentro – ou infiltre-se, se estiver disposto! – mas já aviso: vai se perder tanto quanto eu.

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