sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Êxito


Para ela, parecia tão mais fácil mexer os dedos dos pés e das mãos a partir do momento em que não mais guardou pretensão alguma. Havia rasgado todas as fotos, vertido todas as lágrimas presas na garganta e limpado sua mente de todas as memórias doces. Havia expelido por inteiro suas inquietações, esquecera-se, acabou-se.
No entanto, as suas tentativas (até então bem-sucedidas) de recomeço foram por água abaixo outra vez. Pôde sentir seus órgãos internos transformando-se em líquido instantaneamente, esvaindo-se da segurança recém-adquirida. De forma curiosa, a felicidade ardia no seu íntimo irrequieto, seu interior apreensivo encontrava satisfação em sentir-se perdido nos mesmos olhos mais uma vez.
Os pés dela flutuavam pela noite viçosa enquanto seus próprios olhos cristalizavam o agradável sabor, o deleite de nadar pelo ar como quem desbrava o oceano. As bochechas coraram com o frescor de palavras soltas e despretensiosas, elevou-se aos céus a ideia que tinha de si mesma. Ria-se de como o quadro das últimas semanas haviam se pintado em sua frente: o céu e logo depois o inferno, as sutis loucuras, as distrações e deliciosamente outra vez, o céu. O céu. O céu. O céu. O sentimento risonho. As imensas estrelas cadentes pipocando em suas profundezas. As palavras delicadas. As palavras suaves.
Ela apreciou por dias a surpresa escondida nos minutos silenciosos, não conseguira decifrá-los, mas alguém – havia alguém! – o fez por ela. E só então, após a tortura da queda, pôde saborear e degustar a doce chegada ao topo.

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